No começo da crise ocasionada pela pandemia do novo coronavírus, na segunda quinzena de março, o aumento nas vendas de setores do varejo considerados essenciais foi expressivo, mas começam a desacelerar.
Medições semanais feitas por supermercados paulistas mostram esse movimento. Na última semana de março, suas vendas cresceram 38% ante igual período de 2019, mas a alta desacelerou para 9,8% na terceira semana de abril.
Há uma série de fatores que precisam ser considerados para entender essa desaceleração. Nem todos estão claros ainda. A renda diminuiu com a pandemia, o desemprego cresceu, a cautela do consumidor aumentou.
“Há também o problema em comparar com o ano anterior para ter noção dos impactos da crise. Agora, as famílias já estão abastecidas”, destacou um representante do setor supermercadista durante reunião on-line do Comitê de Avaliação de Conjuntura da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) realizada nesta quarta-feira (29/4).
A pedido dos participantes dessa reunião, seus nomes historicamente não são divulgados.
Os empresários estão estudando o comportamento de compra durante o período de restrições para montar suas estratégias de vendas. A maioria aponta para as vendas on-line.
Com as medidas restritivas, as compras de supermercado feitas pela internet cresceram 72% entre 15 de março e 15 de abril, com a parceria de aplicativos de entrega como Rappi e iFood.
“Não tínhamos uma cultura tão forte de compras on-line no setor, apenas 2% do faturamento dos associados paulistas eram investidos nesse canal antes da crise”, disse o representante do setor supermercadista.
Mas, quem não tinha estrutura de e-commerce tão forte precisou correr atrás. "Agora, esse número têm crescido na ordem de 12% nesse período, e acreditamos que deve se estabilizar em torno de 6% depois da crise.”
Autorizados a funcionar durante a pandemia, os supermercados precisarem contratar para acompanhar o aumento da demanda. Também houve a necessidade de repor funcionários do grupo de risco que foram afastados.
Mas a alta das vendas nesse período de restrições não significou aumento do faturamento. Além do aumento da folha de pagamento, os supermercados têm perdido margens, que já eram baixas, prejudicadas pelo custo das mercadorias vendidas (75% do total) em setores específicos, que subiram muito.
Os supermercados também precisaram incorporar outros gastos para enfrentar a pandemia, como adequação de lojas, barreiras nos caixas, desinfecção constante de produtos, carrinhos e lojas, além de investimentos em segurança privada para evitar possíveis saques e garantir o abastecimento.
“Esses investimentos fizeram nosso custo aumentar e reduziram mais as margens”, disse o representante do setor. “Mas o comportamento de vendas tem sido continuado e expressivo, e deve se manter”, sinalizou.
ON-LINE x OFF-LINE
Vindo de um crescimento de mais de 16% em faturamento em de R$ 16 bilhões, o e-commerce é um dos setores que mais têm se beneficiado desde o início da crise do novo coronavírus, tanto pelo aumento de pedidos como de consumidores que compraram on-line pela primeira vez.
Dados da Ebit|Nielsen apresentados durante a reunião do Comitê de Conjuntura da ACSP mostram que, no meio da pandemia da covid-19, a preparação das pessoas para a vida em quarentena fez com que, em março, o e-commerce registrasse um aumento de mais de 50% ante igual mês de 2019.
“A partir da segunda e terceira semanas de março, cresceu substancialmente a venda de alimentos e bebidas – itens que o consumidor não costumava eleger como principal nas compras on-line”, disse um representante do setor presente à reunião de conjuntura da ACSP.
Com a aceleração forte entre 30 de março e 6 de abril, o e-commerce faturou R$ 4 bilhões em uma semana, sendo que, desse total, 40% dos pedidos de itens de giro rápido foram de novos consumidores. Agora, esse crescimento se estabilizou na casa dos 30%.
Pesquisa recente da Ebit|Nielsen perguntou aos consumidores se eles pretendiam continuar comprando on-line (principalmente nas categorias alimentares), e 75% disseram ter interesse em continuar.
"Isso é um alento para quem está investindo nesse canal, fazendo a transformação. O momento chegou", disse o representanrte do e-commerce.
Mas as empresas que não decidiram isso nos últimos anos, nem nas últimas semanas, devem pensar que o comércio eletrônico deve fechar o ano com uma participação melhor na economia do que o varejo físico, lembrou. "Se não chegarmos a 10% esse ano, chegaremos em 2021."
Para um especialista em varejo presente à reunião, com o varejo físico parado, a percepção é que muitos pequenos lojistas talvez nem reabram suas lojas.
Alguns conseguiram ainda manter um pouco de vendas porque os shoppings criaram marketplaces, então eles têm se sustentado. Já os independentes não vão conseguir reabrir, afirma.
"No varejo físico, 20% estão em shoppings, e o resto na rua. E sabemos que, dos que estão na rua, 90% são micro, pequenos e médios lojistas, sem estrutura para vender pelo e-commerce, que vão sofrer", alerta.
Outra questão, por parte dos grandes varejistas, é o temor de reabrir após o fim da quarentena, recriar estruturas, reconvocar funcionários em férias coletivas ou com contrato suspenso e, logo depois, ter que fechar de novo.
"Temos 577 shoppings no Brasil, e apenas 60 estão abertos. Mas tenho conversado com vários deles, que estão esperando um fluxo altíssimo na reabertura em áreas de classe média e média baixa porque as pessoas não têm o que fazer. E o lazer está no shopping. Então vamos esperar e ver o que acontece."
FOTO: Pixabay
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