“Não tem receita de bolo. Tem que ter muita paixão pelo que faz, gostar muito e saber que tem preços a pagar. Você não ganha de todos os lados e, quando você resolve empreender, você leva ainda uns cinco anos para a roda começar a funcionar. Você tem que investir. Você tem que economizar de um lado para fazer do outro. E não é assim, a toque de caixa, que de repente você começa a ganhar, como estar em um emprego que você já sabe qual é o seu salário”.
Foi com uma declaração tão realista quanto inspiradora para candidato(a)s a empreender, que Luiza Helena Trajano, presidente do conselho de administração do Magazine Luiza marcou sua presença no primeiro evento do ano promovido pelo Conselho da Mulher Empreendedora e da Cultura (CMEC), da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
“Algum sábio do passado falou que o mundo é das mulheres. Agora, imagine o mundo das mulheres empreendedoras”, disse Alfredo Cotait Neto, presidente da Federação das Associações Comerciais de São Paulo (Facesp) e da ACSP. Segundo Cotait, a nova coordenação, representada por Ana Claudia Badra, tem o objetivo de resgatar, ativar e dinamizar o CMEC.
Na manhã desta terça-feira (21/5), Ana Claudia assumiu o cargo e mediou um debate sobre igualdade de gênero no mundo corporativo e outros tópicos relacionados ao empreendedorismo e ao empoderamento feminino nas empresas brasileiras.
Dele participaram, além de Luiza Helena, Ilana Trombka, diretora-geral do Senado Federal; Alice Ferraz, presidente da Fhits, plataforma de marketing digital de influenciadores de moda e lifestyle, e Eduardo Saron, diretor do Itaú Cultural.
Para Ana Claudia, empreender é uma maneira de conquistar sonhos por meio do seu próprio esforço enfrentando desafios, porém ganhando mais liberdade para criar a vida que sempre se imaginou.“Faremos parcerias com várias instituições a fim de promover a participação das mulheres nos conselhos e em cargos de destaque”.
INTUIÇÃO FEMININA
Defensora da criação de cotas para mulheres nos altos cargos de empresas públicas e privadas, Luiza Helena Trajano, presidente do conselho do Magazine Luiza e vice-presidente da ACSP, define a cota como um processo transitório para acertar uma desigualdade.
E nesse sentido, Luiza diz não deixar passar nada em branco. Atenta aos números crescentes de casos de assédio, a empresária conta que realizou uma pesquisa com todos seus funcionários sobre o tema.
A partir das respostas percebeu que era importante implantar um programa de proteção às funcionárias —tanto no ambiente corporativo, como na vida pessoal.
Há um ano, a empresa trabalha uma espécie de campanha publicitária interna “Eu meto a colher sim”, em referência às mulheres que sofrem de violência doméstica e desenvolveu um aplicativo de denúncia para casos do tipo.
“Quero uma empresa que seja boa para as pessoas e com propósito”. “Perdi uma funcionária e hoje, essa questão é discutida com seriedade no Magazine. Minha intuição me diz que se isso acontece lá fora porque não na minha empresa?”, diz.
A empresária diz usar essa mesma intuição para se arriscar ou não nos negócios. Essa sensibilidade, na opinião de Luiza pode ser a única característica determinante na hora de diferir homens de mulheres.
Diante de todas as decisões arriscadas que já tomou, a empresária diz ter sido guiada por muito trabalho, conhecimento e intuição. Das decisões arriscadas que diz ter tomado, ela cita a transformação digital do negócio, uma parceria fechada com um fundo de investimentos e a inauguração de dezenas de lojas físicas no auge do e-commerce – todas até então, bem-sucedidas.
“Estamos ampliando nossas conquistas, mas temos de ser agentes de transformação da sociedade com maior participação na economia e na política e em papeis de destaque”.
Convidado para ser conselheiro do CMEC, Eduardo Saron, diretor do Itaú Cultural, mostrou por que as mulheres são fundamentais para preservação cultural do País.
Citando a mais recente pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, ele ressaltou que as mulheres são as que mais leem dentre a população (59%). Além disso, para as pessoas que tiveram uma influência no hábito de leitura (33% dos entrevistados), as representantes do sexo feminino foram as principais responsáveis (11%).
Ao saírem do lugar de leitoras, no entanto, Saron argumenta que os trabalhos das mulheres são ofuscados, e os nomes que ganham destaque são os masculinos. “Assim como em outros ambientes, isso também precisa ser mudado na literatura. E temos muito a contribuir”, diz.
INDEPENDÊNCIA FINANCEIRA
Foi vendo de perto a situação de mulheres de uma casa de abrigo, em Brasília, que Ilana Trombka, diretora geral do Senado Federal, criou um programa que emprega mulheres em situação de vulnerabilidade econômica em decorrência de violência doméstica. Ilana se incomodou com o que presenciou.
“Vi mulheres que sofriam em casa, mas queriam voltar para aquele ciclo de violência porque aquilo lhes soava natural. Elas tinham uma relação de dependência com seus agressores e isso estava totalmente conectado a uma submissão financeira”, afirma.
Uma realidade muito distante da formação de independência que marcou a história das mulheres de sua família. Com uma trajetória bem-sucedida, Ilana morou sozinha em Israel, se formou como Relações Públicas, foi aprovada num concurso para o Senado e construiu uma carreira invejável.
Foi então que ela percebeu que as necessidades morais não são necessariamente cobertas pela legislação. Na opinião da diretora do Senado, a elevação da autoestima era fundamental para que aquelas mulheres abrigadas vislumbrassem um futuro diferente. Faltava também uma oportunidade real de entrada ou retorno ao mercado de trabalho.
“Embora não seja a única solução, a independência financeira é importante”.
Na tentativa de começar a mudar aquela realidade, Ilana formalizou um projeto no Senado que promove a inclusão de vítimas de violência.
A iniciativa destina uma cota de 2% das vagas de contratos terceirizados a mulheres nessa situação e é realizada em parceria com o governo do Distrito Federal, responsável por identificar essas mulheres. Hoje, o projeto dá uma nova oportunidade de vida a 60 mulheres.
A missão, agora, segundo Ilana, é levar essa mesma ação para o maior número de empresas possível, conscientizar empresários, tirar outras mulheres dessa situação de vunerabilidade e replicá-la em outras cidades e Estados.
A HUMANIZAÇÃO DO DIGITAL
Num momento em que eram as blogueiras começaram a ditar a moda, a empresária Alice Ferraz, se tornou uma especialista em humanizar marcas e também uma espécie de mentora das influenciadoras digitais.
Ao unir o mundo digital ao contexto real das agora chamadas influenciadoras, Alice criou um negócio inédito em 2011, a Fhits. A partir de uma plataforma de mídia, ela reunia as principais produtoras de conteúdo especializadas do país e as conectava com marcas.
Mais que uma curadoria de moda, a empresária tinha como propósito fazer as duas pontas lucrar. De um lado, poderia valorizar o trabalho dessas meninas, que viviam basicamente, de permuta ou de simbólicas remunerações. Do outro, poderia potencializar as vendas de muitos varejistas.
A primeira grife a aderir a proposta foi a Corello, cuja campanha do verão 2011 trouxe Lala Rudge, Camila Coutinho, Mariah Bernardes e Hanneli Mustaparta como garotas-propaganda.
O esquema funcionou e em seis meses, toda aquela produção virou um ofício rentável, tanto para Alice como para seu time de afiliadas, que reúne Alice Salazar e outros 250 nomes. Hoje, uma influenciadora pode ganhar de R$ 2 mil a R$ 250 mil por mês, segundo Alice.
“Quando comecei, minha mãe me perguntava se eu não ia trabalhar. Eu mesma não tinha coragem de chamar aquilo de trabalho, dizia projeto porque simplesmente, ninguém me apoiava”, diz.
“Hoje, vejo a importância daquela minha intuição. As influenciadoras são as grandes responsáveis por humanizar o digital para muitas marcas. Temos impacto no mercado”.
FOTOS: Paulo Pampolin/Hype
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