Entre janeiro e setembro deste ano a participação de estrangeiros aumentou e, até o fim do ano, deve ultrapassar a de brasileiros em número de negócios
Ao declarar, em Nova York, na semana passada, que "o Brasil está em liquidação", o empresário Abilio Diniz tornou pública uma afirmação que, há meses, ronda os escritórios de bancos, fundos de investimento e empresas brasileiras. Na descrição de alguns executivos do mercado financeiro, é como se o País tivesse se tornado, com a desvalorização do real, um imenso outlet: com negócios atrativos, que ficam ainda mais interessantes, para os gringos, ao converterem as moedas.
A pesquisa mensal da consultoria PwC sobre fusões e aquisições no País dá uma ideia desse movimento. Entre janeiro e setembro deste ano, embora o número de transações tenha caído 12% em relação ao mesmo período do ano passado, a participação de estrangeiros aumentou e, até o fim do ano, deve ultrapassar a de brasileiros em número de negócios. A diferença entre eles foi diminuindo ao longo do ano, até chegar, em setembro, a 50% de participação cada um. É a primeira vez que isso acontece desde que a consultoria começou a acompanhar as fusões e aquisições no Brasil, em 2002.
"É uma nova onda de investimento estrangeiro chegando ao País", diz Rogério Gollo, sócio da PwC. "O último grande movimento desse tipo aconteceu entre 2008 e 2010, com a perspectiva de crescimento da economia brasileira."
Agora, os investidores se aproveitam do que alguns empresários nacionais têm chamado de "tempestade perfeita", do lado de cá: ao mesmo tempo em que a alta dos juros fez crescer a dívida das empresas, o desaquecimento da economia derrubou a demanda, fragilizando a operação de muitas companhias.
Um recorte feito pelo banco de investimentos Greenhill faz esse retrato. Em 2010, num grupo de 35 transações, 26% delas envolviam a venda de empresas com índice de alavancagem superior a três vezes o Ebtida (indicador que mostra o potencial de geração de caixa). Neste ano, em um total de 54 transações analisadas, 55% estavam nessas condições.
"Esse não é um nível de endividamento considerado saudável no mercado", diz Daniel Wainstein, presidente do Greenhill no Brasil. "O aumento desses níveis reduz o poder de negociação dos vendedores."
Na semana passada, a venda da divisão de cosméticos da Hypermarcas para a multinacional Coty, por R$ 3,8 bilhões, foi emblemática. A empresa brasileira queria se desfazer do negócio para zerar seu endividamento bilionário e recuperar o fôlego para investir na venda de medicamentos.
Fontes do setor ponderam, no entanto, que o preço de fechamento do negócio não foi uma barbada, já que a Coty pagou cerca de 20 vezes o Ebtida da divisão de consumo da Hypermarcas. "A entrada deles era considerada estratégica no País, que é um dos maiores consumidores de produtos de beleza do mundo, por isso pagaram um prêmio pelo negócio", disse uma fonte próxima à transação.
A Coty é apenas uma de várias multinacionais que voltaram a olhar com lupa o mercado brasileiro nos últimos meses. A mexicana Femsa, por exemplo, aproveitou o momento para fazer mais uma aquisição no País.
A divisão de logística do grupo, que também é distribuidor da Coca-Cola, acabou de anunciar acordo para a compra da paranaense Atlas Transportes. O valor não foi divulgado, mas o Estadão apurou que o negócio ficou em R$ 1,1 bilhão.
Ao mesmo tempo, o grupo americano de educação Devry, que já tem universidades no Nordeste, é um dos favoritas para comprar uma fatia da escola de negócios Ibmec, em São Paulo. As empresas não comentam o assunto.
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