Um dos maiores especialistas em contas públicas do País, José Roberto Afonso, pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV), coloca em xeque os cálculos do governo para medir o tamanho da renúncia do Simples (regime de tributação simplificado das micro e pequenas empresas) e de outros benefícios tributários.
Em estudo, Afonso avalia que as renúncias medidas pela Receita Federal estão superestimadas. Para ele, os benefícios fiscais viraram uma "panaceia" e permanecem sem esclarecimentos da memória de cálculo e aspectos metodológicos.
As renúncias ganharam destaque depois que o ministro da Economia, Paulo Guedes, avisou que tem um plano para cortá-las a fim de reduzir mais rapidamente o déficit das contas públicas.
"Além da grave carência de transparência em torno do cálculo do gasto público indireto, difícil é traçar cenários sobre quanto se pode recuperar de recursos diante da óbvia reação dos beneficiários à sua redução", diz Afonso, que acompanha com lupa as contas públicas há mais de 30 anos.
O economista cobra maior transparência da Receita e acesso a dados básicos e afirma que, como ocorre com o Simples, é muito provável que todas as renúncias estejam superestimadas. "Eles (os técnicos) repetem a mesma apuração do passado ignorando o que se passou."
O economista da FGV, um dos autores da Lei de Responsabilidade Fiscal, critica que não faltam recursos para que sejam divulgados os microdados da Receita, já que a escrituração fiscal está toda hoje digitalizada.
Para Afonso, o caso do Simples é emblemático já que, na sua avaliação, não há consistência na verificação dos dados, o que tem levado a previsões como a de o Simples vai gerar uma renúncia de R$ 87,3 bilhões só em tributos federais em 2019.
Ele questiona, inclusive, a própria classificação como renúncia, uma vez que assim não são tratadas as exportações, com imunidade constitucional, mas o mesmo princípio não se aplica às microempresas, apesar da mesma Constituição assegurar tratamento diferenciado para elas.
Afonso lembra que o ex-deputado Luis Carlos Hauly (PSDB-PR) e o ex-senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) já pediram, no passado, com requerimento parlamentar, a memória de cálculo, que nunca apareceu.
No estudo, economista avalia que as dúvidas metodológicas aumentam quando observada com lupa a consolidação das contas de 2013, último ano-calendário para o qual foram publicados dados básicos declarados pelos contribuintes. Ou seja, é o último ano para o qual se conhece a consolidação do IRPJ no País.
Pelos seus cálculos, a renúncia efetiva é R$ 23 bilhões em 2013. Enquanto isso, o demonstrativo de gasto tributário da RFB, mesmo com bases efetivas, calcula uma renúncia de R$ 62 bilhões - ou seja, 2,7 vezes maior. Ele defende a avaliação periódica e detalhada de todos benefícios fiscais.
IMAGEM: Thinkstock
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