Cada vez mais limitados a pagamentos com valor elevado, o volume de transações com cheques caiu para menos da metade em menos de uma década. O de cartões quase triplicou. É uma tendência internacional
A quantidade de transações com cheques em 2016 foi menos da metade do número registrado em 2008, segundo dados divulgados recentemente pelo Banco Central do Brasil. A queda não é sem razão.
Ao longo das últimas décadas, consumidores trocaram os talões de cheque pela comodidade e segurança dos cartõesde crédito e débito.
Os lojistas, por sua vez, perceberam que não só cada vez mais clientes optavam pelos meios eletrônicos em suas compras, como os custos da operação de venda no cartão mais do que compensavam os riscos associados às vendas no cheque.
Afinal, quando realizava uma venda nesta modalidade, era o próprio lojista que arcava com riscos como fraude e inadimplência, ao contrário das vendas no cartão, em que os riscos recaem sobre os bancos emissores do plástico.
Sem contar, é claro, a maior praticidade das vendas no meio eletrônico, cujos valores são depositados diretamente na conta bancária do estabelecimento comercial.
Em apenas 9 anos, as transações com cartões de pagamento praticamente triplicaram, passando de 4,7 bilhões em 2008 para 12,7 bilhões em 2016, enquanto a quantidade de transações com cheque (considerando também cheques sem liquidação interbancária) passou de 2 bilhões para 900 milhões no mesmo período, ficando, no ano passado, pela primeira vez abaixo da marca de 1 bilhão.
Enquanto a utilização do cartão migra para itens de menor valor e também ganha espaço nas compras das famílias de menor renda, o cheque fica cada vez mais restrito às compras de tíquete elevado.
Com isso, o valor médio de cada transação com cartão caiu, em termos reais (já considerando a inflação), de R$ 115 em 2008 para R$ 87 em 2016. O tíquete médio das transações com cheque, por sua vez, saltou de R$ 2.147 para R$ 2.568 no mesmo período.
A tendência de redução da participação dos cheques nas vendas do comércio parece um caminho sem volta. De acordo com nossas estimativas na Boanerges & Cia., consultoria especializada em varejo financeiro, a parcela do consumo das famílias paga com cheque deve ficar abaixo de 0,5% em 10 anos – atualmente encontra-se na casa dos 2%; há 10 anos, era de mais de 10%.
Até 2026, os cartões devem responder por ao menos 40% do consumo das famílias, contra pouco mais de 30% observados atualmente.
A expectativa também é de redução da participação dos pagamentos em dinheiro, que devem passar dos atuais 40% do consumo das famílias para pouco mais de 30% em 10 anos.
O número de saques nos caixas eletrônicos, por sinal, registrou em 2016 a primeira queda na série histórica iniciada em 2008, passando de 3,6 bilhões em 2015 para 3,4 bilhões no ano passado – fenômeno que também pode estar associado à crise e à queda da renda dos consumidores, é verdade.
Os obstáculos para um crescimento ainda mais rápido do cartão sobre o dinheiro e o cheque são os hábitos da população, a exclusão bancária e os custos da operação para o lojista (taxa de desconto, aluguel da maquininha e juros da antecipação de recebíveis), que podem limitar a aceitação de meios eletrônicos nas vendas.
No caso do cheque, também é entrave para uma migração mais acelerada dos pagamentos para os meios eletrônicos os limites de crédito, que muitas vezes comprometem o uso do cartão em compras de valor elevado – embora a modalidade de parcelamento lojista disponível para vendas no cartão já tenha praticamente substituído o cheque pré-datado.
As transferências eletrônicas (TED e DOC), por sua vez, têm sido cada vez mais utilizadas nos pagamentos de maior valor, onde a presença do cheque ainda é relevante.
De qualquer forma, o fenômeno de desaparecimento gradual do cheque não é apenas nacional. No Reino Unido, por exemplo, onde foram realizadas 558 milhões de transações com cheque em 2015, segundo últimos dados disponíveis do Banco de Compensações Internacionais.
Compensações Internacionais, a modalidade, que, além de riscos para consumidores e lojistas, também representa custos para o sistema de compensação bancária, deve ser aposentada até o final de 2018.
Em outros países da Europa, as transações com cheque são ainda mais raras. Na Holanda, também em 2015, foram apenas 198 mil transações. Na Suécia, no mesmo ano, somente 80 mil.
E a sua loja, ainda aceita cheques ou já aposentou a modalidade?
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