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Com dólar nas alturas, Franca não poderia estar mais feliz

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Notícias 10 Mar, 2016
Não são muitos os brasileiros que pensam na crise do fim da década de 1980 ao início dos anos 1990 como uma era gloriosa. Mas para a população de Franca, no interior de São Paulo, foi uma época dourada.

Não são muitos os brasileiros que pensam na crise do fim da década de 1980 ao início dos anos 1990 como uma era gloriosa. Mas para a população de Franca, no interior de São Paulo, foi uma época dourada.

A capital brasileira dos calçados masculinos está entre algumas das regiões industriais do país que viram parte do seu setor industrial se atrofiar em meio ao frenesi dos mercados emergentes com a explosão das commodities nos anos 2000. 

Agora que a moeda do país sofreu forte desvalorização, tornando as exportações brasileiras mais baratas, Franca olha para o futuro em busca de dias melhores.

Quem anda por essa cidade de porte médio, com cerca de 300.000 habitantes, não tem dificuldade em encontrar empresas que planejam retomar o fôlego de produção, em um momento em que companhias estrangeiras como a gigante varejista Wal-Mart e o Citibank diminuem operações no Brasil ou deixam o país de uma vez. 

O otimismo dos fabricantes locais em relação a exportações, que também é reconhecido em outros poucos setores como o de fabricantes de veículos, é um raro ponto de esperança em um país abatido pela pior recessão em um século.

“Este momento pode ser determinante” para os fabricantes locais, disse Giuliano Gera, de 38 anos, fundador da fabricante de calçados PG4. Mesmo com a piora da crise no Brasil, a receita da sua empresa aumentou em um terço em 2015, para R$ 25 milhões (US$ 6,6 milhões) – e ele estima um avanço de mais 20 por cento neste ano. “O real no nível que estamos vendo é ótimo para nós”.

Há inúmeras razões pelas quais a indústria brasileira se fragilizou nas últimas décadas, que vão desde regulações onerosas e pesadas até a preferência do governo pelos laços comerciais com a China em detrimento dos EUA. 

Entre os fabricantes locais há praticamente um consenso de que o real sobrevalorizado foi o principal culpado. 

O valor da moeda mais do que dobrou do fim de 2002 até meados de 2011, acima dos ganhos de todas as outras moedas mais negociadas do mundo, e muitos fabricantes simplesmente não puderam competir.

O impacto foi especialmente duro em Franca, onde a indústria de sapatos emprega aproximadamente um em cada 10 trabalhadores. 

As exportações de calçados do município haviam quase quadruplicado para US$ 257 milhões na década até 1993, uma época em que o país enfrentava uma hiperinflação que o empurrou para a beira do colapso econômico. 

Mas em 2015 as exportações de sapatos que incluem marcas como Calvin Klein e Cole Haan haviam caído para US$ 78,5 milhões, segundo dados do sindicato da indústria de calçados de Franca, o Sindifranca.

A tendência foi observada em todo o Brasil e ajuda a explicar por que o país foi atingido tão fortemente pelo colapso das commodities. 

Há duas décadas, os produtos manufaturados respondiam por 55 por cento das exportações e as commodities representavam cerca de 45 por cento. 

Em janeiro, os produtos industriais haviam caído para 38 por cento e as commodities respondiam por quase dois terços das vendas ao exterior, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. 

Em 2009, a China substituiu os EUA como maior parceiro comercial do Brasil.

Foco no exterior

As fabricantes que perderam participação no mercado internacional e mudaram seu foco para o mercado doméstico agora enfrentarão “um momento difícil”, disse Francisco Crizol, gerente comercial da Netto Footwear. 

A empresa projeta que suas exportações se multiplicarão em até seis vezes até o fim de 2016.

“Muitos fabricantes não se atualizaram com a tecnologia necessária, não cultivaram contato com os clientes ou perderam o know-how de como produzir e como vender para clientes estrangeiros,” disse José Carlos Brigagão, presidente do Sindifranca. “É como deixar um gigante dormir. Agora é difícil acordá-lo novamente”.

As fabricantes de sapatos de Franca estão cortejando novos clientes internacionais em eventos do setor e tentando reconstruir antigas relações. Elas são apenas um exemplo de setores que devem se beneficiar com a aceleração das exportações. 

Os envios de veículos produzidos por empresas que incluem Volkswagen e Ford Motor ao exterior aumentaram em mais de um terço em janeiro em relação ao mesmo mês do ano anterior, disse a Anfavea, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores.

Embora a expansão não seja suficiente para compensar o colapso da demanda local, o crescimento está ajudando a reduzir o impacto do prejuízo, disse o presidente da associação, Luiz Moan Yabiku Junior.

“No momento, todos os nossos membros estão correndo para exportar”, disse Moan.

Pele de cobra

O fabricante de sapatos Fernando Xavier, 42, da Joseph Paschoal Bootmaker, está negociando com três possíveis novos clientes da Itália no momento e considera que a desvalorização do real pode dar suporte de volta ao momento parecido com o que a Franca experimentou do fim dos anos 1980 ao início dos anos 1990. 

Embora ainda fosse adolescente na época, ele se lembra das máquinas de costura da fábrica de partes de calçados de sua família funcionando a pleno vapor -- e recorda os carros e fazendas que os homens de negócios locais compravam quando as exportações estavam a todo vapor.

“Os sapatos eram o nosso ganha-pão”, disse ele, que fabrica sapatos de alto padrão incluindo botas feitas sob encomenda e vendidas por até cerca de US$ 2.000 o par. 

“Franca era como uma ilha no meio de um país que estava sofrendo com o desemprego e a inflação alta”. Agora “precisamos realmente trabalhar duro para recuperar a participação de mercado que perdemos”.

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